Caminhava distraída, pela beira da
praia, quando percebeu o desenho bem ao lado. A sombra que se formava na água
tinha contornos mais fartos do que os do corpo que reproduzia. Era uma forma
rechonchuda, bem-humorada. Achou graça na companhia e decidiu brincar com ela.
Os movimentos eram feitos afim de explorar a figura criada pelo sol. Por vezes
exuberante, em outras mais esguia, até se tornar quase irreconhecível,
distorcida pelos passos e rodopios. Decidiu, ali, observá-la diariamente. Seria
a grande testemunha dos dias que estavam por vir. E foi assim que ela se
entregou à energia daquele local.
Se viu conduzida pela atmosfera livre, selvagem
e absolutamente acolhedora. Ali havia vida em abundância. Os pés em contato
direto com a areia; a pele tocada pelo sol e pelo vento; o barulho das ondas e
as músicas que se encaixavam perfeitamente naquele cenário… teve a sensação de
que, pela primeira vez, sentia de fato a energia vital que existe em tudo o que
está ao redor. Naquele ambiente, experimentou uma sensualidade diferenciada.
Sem apelos, mas solta, leve e natural.
Descobriu-se uma exploradora: de sons,
de sabores, de aromas e de desejos. Quis dançar quando se viu sozinha na praia; passou a tarde na rede, balançando como uma criança despreocupada com o tempo;
prestava atenção, sem cerimônia, às conversas: as piadas em torno dos turistas
estrangeiros, as brincadeiras entre os colegas de trabalho, diálogos entre
famílias, amigos… Ouviu, com atenção, cada história que lhe foi compartilhada. Se
deliciava com o sotaque de sons abertos, ritmado. E por falar em música, “foi
ter” com a dança que sempre lhe tocou mais fundo. Forró, no nordeste, ganha sentidos
ainda mais fortes e deve, de preferência, ser dançado com a gente e da forma de
lá: sem pudor, frescura ou conversa fiada. O corpo à serviço do som do
triângulo, da zabumba e da sanfona.
Contemplou cada pôr do sol e o
espetáculo de cores criado a partir dele. Sentiu o impacto da força das dunas,
montanhas de areia capazes de encobrir vilas inteiras, esconder lagoas e
vegetação. A natureza ensina com a prática e onde é exuberante, há lições em
pequenos detalhes. Agradeceu a Deus e aos desbravadores,
os que primeiro chegaram, perseveraram e facilitaram o acesso a um canto tão
especial! Jericoacoara é vista, por muitos, como uma espécie de paraíso. Pra
ela, pareceu ser uma das mais lindas formas de oração.
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